Fazia calor e uma humidade que nos deixava distendidos sobre corpos já cansados, massacrados de tantos quilómetros, afinal tinhamos percorrido «meio planisfério», mais de 10 mil quilómetros, e só esse peso do mundo sobre os nossos corpos tornáva-nos seres mais escondidos, menos atrevidos à impureza da volúpia, mais concentrados na força da razão, que já nessa altura nos mostrava uma Shangai pré-dita de futuro. Uma Shangai para 2010, rezava assim, a exposição que acabáramos de visitar, uma demonstração programada para falar da China, de uma China que nos teima chegar em discurso pretérito, como se a China pudesse continuar a ser dita conjugando outras formas vebais, senão justamente o futuro de um povo imenso, 1.3 biliões de pessoas. Houve festa nacional quando a criança fez girar a máquina da estatistica, e a China ficou cumplice de uma matemática mais redonda, mais esférica, mais central.
Quando a China depertar..., dizia o livro...só que estejam atentos, a China já desperta manhã cedo, e os chineses estão satisfeitos por terem encontrado esse centro, por terem girado a tombola do mundo mais para o lado de Shangai, e lá encontramos brasileiros, espanhóis, tantos irmãos nossos, que nos dana a sensação de estarmos mais empenhados em olhar o mundo, do que protagonizar a história.
Nós portugueses sempre gostámos de olhar, só que o nosso olhar é amorfo, timido, sem graça, um olhar pouco atrevido, um olhar vaidoso. Um olhar vazio.
E nós europeus? Olhamos em que direcção? Do sol nascente?
Do 31 primeiro andar, a vista que inundava a retina do nosso cérebro era Shangai. E Shangai é uma cidade que gira veloz, tão veloz, que os nossos olhos já não acompanham as torres que se alastram pela geografia de Shangai.
Shangai ousou pensar a melodia e inventou o poder de construir uma sociedade paralela onde os velhos vivem em ruas perpendiculares e os mais jovens em artérias principais.
Atenção...há dez anos, Shangai (ainda) não existia.