sexta-feira, outubro 24, 2008

Distribuição do Tempo - um poema do argentino Julio Cortázar




«Cada vez são mais os que crêem menos
Nas coisas que preenchem as nossas vidas,
Os mais altos, os incontestáveis valores de Platão e Gothe,
O verbo, a pomba sobre a arca da História,
A sobrevivência da obra, a descendcência e as heranças
Nem por isso caem do céu do neófito
Na ciência que expõe máquinas na lua;
Na verdade, tanto faz que o doutor Barnard
Faça transplantes do coração
Era preferivel mil vezes que a felicidade de cada um
Fosse o exacto, o necessário reflexo de cada vida
Até que o coração insusbtituível pudesse dizer simplesmente basta.
Cada vez mais são os que crêem menos
Na utilização do humanismo
Para o nirvana estereofónico
De mandarins e estetas.
Sem que isto queira significar
Que quando houver um instante de inspiração
Não sei leia Rilke, Verlaine ou Platão,
Ou se escute os nitidos clarins,
Ou se vislumbre os trémulos anjos
De Angélico.»


Distribuição do Tempo, Julio Cortázar (1914-1984) - Argentina
Trad.:Jorge Henrique Bastos
Fotos © Clara de Freitas - Terra do Fogo - 2008
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