Vasco Graça Moura (PPE-DE ), relator . – Reconhecemo-nos enquanto europeus, não obstante todas as nossas diferenças, por força da cultura europeia. Ela representa a herança comum e dinâmica em que a diversidade identitária e linguística se reconduz a uma matriz complexa na qual avultam a tradição greco-latina, a tradição judaico-cristã e a tradição mediterrânico-muçulmana sem que, todavia, estes três vectores esgotem o quadro dos elementos que a formam.
Tratando-se de promover a construção europeia, torna-se necessário prestar uma especial atenção à cultura, reabilitando a herança comum e estimulando a diversidade de modo a encontrar-se um equilíbrio entre forças centrípetas e forças centrífugas. Isto é, dando à herança comum todo o seu peso e permitindo aos mais de 400 milhões de cidadãos da União que se conheçam melhor uns aos outros nas suas identidades culturais e linguísticas específicas.
Seria manifestamente errado falar-se em integração cultural da Europa. Um dos aspectos mais fascinantes da nossa civilização está exactamente em a Europa dever assumir-se como uma unidade comum e uma unidade realizada na e pela diversidade das suas aberturas ao Homem e ao mundo.
O "Cultura 2007-2013" deve, antes de mais, ser o programa-quadro não para uma integração, mas para uma intensa comunicação cultural entre os cidadãos da Europa e feita à escala da Europa e dos seus valores. Tudo isto significa que as políticas europeias da cultura têm de ser prosseguidas na contemplação sistemática de uma mais-valia europeia, sob pena de, não sendo assim, perderem todo o sentido e acabarem por não se distinguir das políticas de cultura nacionais. Mas também significa que se torna imprescindível a cooperação entre as instâncias europeias, os Estados-Membros, os agentes e cooperadores culturais de cada um deles e as suas redes transnacionais, na perspectiva da realização das políticas culturais comuns.
O programa "Cultura 2007-2013" é um programa de terceira geração. Tem em conta a experiência dos anteriores e procura soluções mais adequadas face a essa experiência.
Devo dizer que, pessoalmente, teria preferido uma forma correspondente à da primeira geração - Raphael, Ariane e Kaleidoscope -, bem delimitada nas suas áreas relativas às artes, às letras, aos espectáculos e ao património cultural. Os recursos são escassos, o número de candidaturas a apoio e subsídios é cada vez maior e as políticas, para serem verdadeiramente eficazes, deveriam centrar-se sob poucos objectivos muito claros e muito bem definidos, mesmo sacrificando outras possibilidades. Mas oxalá o novo dispositivo resulte e traga um contributo mais rigoroso e positivo a esta área.
Procuramos aperfeiçoar a proposta da Comissão e introduzi-lhe algumas correcções, adequá-la melhor aos fins em vista, consagrar mais claramente a dimensão e a importância da herança cultural comum, sem prejuízo da criação contemporânea.
Com todo o respeito pelo Comissário Figel’, devo dizer-lhe que não fica bem à Comissão Europeia recusar uma referência explícita a um aspecto que tem a ver com a herança cultural, com o gigantesco património vivo, tanto material como imaterial, que os séculos acumularam e que tanto contribuiu para nos definir como europeus. Esse aspecto não se reconduz a um mero caso sectorial. Falamos de uma matriz, de uma dimensão comum a todos os sectores, e que é fundamental.
Entendemos também que as disposições relativas à preservação dos sítios da memória europeia ligados à memória sinistra da violência totalitária, tanto nazi como estalinista, ficariam mais bem colocadas no programa "Educação para a Cidadania". Tanto este entendimento, como a sua aceitação por parte da Comissão Europeia, ficaram formalmente expressos em acta da comissão parlamentar.
Enfim, Senhor Presidente, não quero deixar de aludir a um ponto altamente preocupante: refiro-me ao orçamento. Os números do relatório Böge são meramente indicativos. Mesmo assim, foram tomados em consideração. Onde nesse relatório se apontava para os 566 milhões de euros no tocante a este programa, apontámos nós para os 600 milhões, porque o próprio relatório Böge previa uma reserva que permitia fazê-lo. Este valor é modestíssimo! Todos os responsáveis europeus, os da Comissão Europeia incluindo o seu Presidente e o seu Comissário para a Cultura, os do Parlamento incluindo os presidentes dos grupos parlamentares e um sem número de colegas e ainda os do Conselho incluindo praticamente todos os ministros da cultura, de há muito se vêm pronunciando a favor da necessidade de aumentar substancialmente o orçamento nesta área.
A União passou de 15 para 25 Estados-Membros. A unidade europeia implica cada vez mais uma acção intensiva na área da cultura. A própria Estratégia de Lisboa não passará de letra morta se as políticas culturais europeias soçobrarem sem conseguir os seus objectivos ligados tanto à herança cultural comum como à diversidade cultural linguística nos Estados-Membros.
Não pode haver Estratégia de Lisboa se não nos conhecermos melhor uns aos outros. Sem nos conhecermos melhor uns aos outros, na variedade das nossas identidades históricas, culturais e linguísticas, não podemos cooperar a sério uns com os outros num desígnio comum. Isso só é possível com políticas culturais que visem uma mais-valia europeia e sejam dotadas dos meios necessários para tal.
Proponho, pois, que votemos o relatório que tive a honra de subscrever e que consagra também toda uma série de úteis contributos dos meus colegas dos vários quadrantes políticos que integram a Comissão da Cultura do nosso Parlamento.